SOBRE O PROJETO

Salvador foi o segundo maior porto de desembarque de africanos nas Américas durante a vigência do comércio transatlântico de pessoas escravizadas. Navios negreiros da Bahia carregaram cerca de um milhão, trezentos e cinquenta mil mulheres, homens e crianças que, aprisionados e escravizados, experimentaram a traumática travessia do Oceano Atlântico, segundo estimativas recentes. Algo em torno de 150 mil pereceram durante a travessia. No final, aproximadamente um milhão e duzentas mil pessoas chegaram com vida à Bahia.

O trabalho forçado dos africanos escravizados e seus descendentes está indelevelmente marcado nas ruas, prédios públicos e privados, igrejas e outros espaços da cidade de Salvador. O setor de venda de alimentos funcionava pelo braço africano, assim como o setor de transporte de mercadorias e de pessoas entre as ruas e ladeiras da Cidade da Bahia. Serviços mais especializados, como de sapateiros, barbeiros, marinheiros, e ferreiros também eram realizados por gente escravizada. No interior das residências, as mulheres negras atuavam em serviços domésticos variados, às vezes cumprindo dupla jornada, no interior das residências e nas ruas da cidade.

O negócio de compra e venda de seres humanos enriqueceu muita gente. Na Baía de Todos-os-Santos, traficantes portugueses e brasileiros organizaram expedições escravistas à África – mais de quatro mil durante a era do tráfico de africanos. Fortunas foram erguidas com o braço cativo, que construía navios, plantava, minerava, coletava produtos das matas e pescava. Mesmo após o fim definitivo do tráfico de africanos, em 1850, a escravidão continuou em território nacional até 13 de maio de 1888, sendo a última nação das Américas a decretar o seu fim.

Apesar desse infame histórico, Salvador é, ainda hoje, pontilhada por homenagens a traficantes de escravos, 170 anos após a extinção do tráfico e 132 anos depois da abolição formal da escravidão. O imenso poder econômico e político desses homens converteu-se em poder simbólico. Sua memória passou para a posteridade como grandes benfeitores, homens de negócio, empreendedores. Foram homenageados com nomes de ruas, estátuas e praças públicas, ocupando lugar privilegiado no patrimônio urbano em conjunto com outros símbolos de dominação colonial. Pessoas que defenderam até o último momento a continuidade da escravidão dão nome a artérias importantes da cidade. Há um aspecto em comum nessas honrarias: nelas não se encontram informações sobre a participação dos homenageados nos projetos de dominação e exploração no qual desempenharam papel ativo. Um dos propósitos do site SALVADOR ESCRAVISTA é oferecer subsídios históricos que possibilitem uma melhor compreensão sobre o papel desses indivíduos no desenvolvimento de uma sociedade marcada pela desigualdade e pelo racismo. Para saber mais sobre essas histórias acesse a seção HOMENAGENS CONTROVERSAS.

A memória pública é uma construção social em permanente conflito. Como um campo em disputa, as ruas da cidade também foram batizadas com os nomes de personagens históricos que enfrentaram as estruturas escravistas, bem como de eventos que simbolizam marcos de lutas pela liberdade e pela cidadania. Com o objetivo de valorizar essas homenagens e tornar essas histórias mais conhecidas criamos a seção HOMENAGENS REPARADORAS.

Mas a memória também é feita de esquecimentos. Espaços que em outros tempos foram marcantes para as populações escravizadas e seus descendentes como lugares de luta, dor ou celebração, acabaram sendo encobertos por novas camadas de concreto ou de significados. É também intuito desse site fazer com que sejam continuamente lembrados. Aqui eles podem ser encontrados na seção LUGARES ESQUECIDOS.

Acreditamos que a conservação de determinadas homenagens no espaço público, do modo como se encontram, acabam por perpetuar valores contrários aos ideais professados pela própria Constituição brasileira, que elege entre seus valores supremos a igualdade e a justiça. O itinerário para uma sociedade mais igualitária e justa se apresenta em variadas formas. Uma delas, certamente, é através do direito à cidade e da construção de uma memória pública mais plural e democrática. O projeto SALVADOR ESCRAVISTA busca promover saberes históricos em afinidade com esses valores e com a difusão do saber acadêmico.

Nesse sentido, SALVADOR ESCRAVISTA pretende também contribuir para o ensino de história nos níveis fundamental e médio, servindo como uma ferramenta de pesquisa sobre a história de Salvador relacionada ao impacto da escravidão na sociedade soteropolitana, representada, entre outros aspectos, pelas homenagens em estátuas, prédios e nomes de ruas. Os locais estão identificados no site na seção “MAPA” através de marcadores e verbetes. Cada um dos verbetes será acompanhado por textos curtos de especialistas. Nesses textos teremos a seção “Para saber mais”, com indicações de leituras para aqueles que desejarem aprofundar o conhecimento sobre determinados temas.

SALVADOR ESCRAVISTA é um projeto colaborativo que conta com a participação de especialistas em diversas áreas: história da África, comércio transatlântico de pessoas escravizadas, escravidão atlântica e pós-abolição nas Américas etc. Sendo um projeto colaborativo e mutável como o assunto de que trata, novos conteúdos serão adicionados futuramente ao site. Para perguntas, sugestões e informações, favor entrar em contato através do e-mail ssaescravista@gmail.com.


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